terça-feira, 30 de outubro de 2012

Um mundo inteiro na cabeça


                Hoje vou falar um pouco sobre como todos nós nos maltratamos através da fantasia. Fantasia aqui é entendida como toda e qualquer idéia que não seja comprovada/trazida à realidade. São nossas crenças a respeito de certas situações, as várias explicações e possibilidades que elaboramos em nossas mentes para justificar comportamentos alheios, acontecimentos, etc.
                Passamos tanto tempo fantasiando, que muitas vezes confundimos a fantasia com o que é real. Quando se pensa “não farei isso, não será bem visto; fulano está me ignorando porque aquele outro dia eu agi daquela forma e ele não gostou; se eu expuser o que sinto, o outro não irá aceitar bem”, entre outros exemplos, o que está acontecendo é que a realidade está sendo deixada de lado. O aqui-e-agora, o momento presente, fica imperceptível aos olhos de quem está ruminando suas fantasias. E na grandissíssima maioria das vezes, as fantasias são “catastróficas” e nos colocam num lugar de sofrimento, angústia, ansiedade, impotência.
                Essa não é uma ação fácil de se reconhecer,até porque serve a um propósito. As fantasias, por mais dolorosas que sejam muitas vezes, servem como uma defesa. São defesas de pessoas que já se machucaram muito ao exporem seus sentimentos, pensamentos, ao se abrirem para o mundo e não se sentirem aceitas e acolhidas. Foram aprendendo todas essas crenças que hoje sustentam suas fantasias; congelaram em situações passadas e continuam agindo em seu modo de emergência, como se ainda hoje precisassem ter “o pé atrás”, manterem-se céticas, objetivas, racionais, “duras”. Na verdade, o que acontece é que quando se está nesse funcionamento disfuncional, busca-se o tempo todo, situações e acontecimentos que confirmem suas fantasias e crenças. O “neurótico” caminha ao encontro daquilo lhe faz sofrer e que mantém a sua neurose. E esse não é um movimento consciente, não é algo prazeroso (muito pelo contrário), mas é conhecido. ESSA dor, pelo menos, lhe é conhecida; com ela ele sabe lidar de alguma forma. É aquela sensação que aparece numa frase que talvez muitos já tenham dito ou escutado de alguém: “tá vendo? Eu tinha razão de pensar o que eu estava pensando. Aconteceu o que eu temia”. No entanto, o vazio que aparece quando pensa na possibilidade de que talvez as coisas não sejam assim, traz uma ansiedade muito grande de não saber o que virá, tira a ilusão de que é possível ter algum controle sobre as situações.
                Hoje, pensando a respeito desse tema, lembrei de um trecho de um livro que li e dizia que “cada um recria seu mundo, diariamente,  às vezes para redimir-se, às vezes para condenar-se”. É mais ou menos isso que as fantasias representam nas vidas de todos nós. Todos os dias nós recriamos nosso mundo, e podemos fazê-lo lidando com a realidade – e isso significa muitas vezes se colocar-se em situações de vulnerabilidade (que não é sinônimo de fraqueza); verificar se aquilo que estamos percebendo e sentindo é real; perguntar, tomar uma iniciativa, dizer o que se está sentindo/percebendo, para que então o outro possa nos dizer o que se passa, e assim possamos sair da fantasia e adentrar na realidade, ficar no agora. Em contrapartida, se ficamos ruminando nossas fantasias, recriamos um mundo de condenação, em que nós mesmos somos os carrascos e nos privamos do novo, de milhares de outras possibilidades e de inclusive, podermos ter vivências restauradoras.
 

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