segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Confluência

 As interrupções no processo de identificação da necessidade, de ir ao meio satisfazê-la e, em seguida retornar ao relaxamento, podem ser caracterizadas como saudáveis (ajustamento criativo) ou disfuncionais (ajustamento neurótico). Essas interrupções podem ser variadas: confluência, introjeção, projeção retroflexão e egotismo. Como tudo na abordagem gestáltica, a neurose é entendida como um processo, e portanto, cada uma dessas interrupções dá sutentação e está interligada às outras. Isso ficará mais claro a seguir.
Confluência significa fluir para um mesmo ponto ou lugar. Em Gestalt-terapia, a confluência supõe a não-consciência, constitui aquilo que serve de fundo para a formação da figura, o sistema de sustentação. Ou seja, tudo aquilo que tornou-se hábito, que faz parte de nosso repertório de experiências, aprendizado, memória, foi através da confluência. Quando podemos acessar essas informações, ocorre a confluência saudável; mas, no sentido disfuncional, trata-se de um apego a uma situação antiga, à respostas antigas que não mais são necessárias na atualidade.


Imaginemos a seguinte situação: estamos chegando à praia e esquecemos de levar um chinelo. No caminho para chegar até a praia, há vegetação com rosetas e espetamos nosso pé. Nós entendemos que para passar por vegetação assim, precisamos de chinelo. Agora, estamos em outra situação, indo à praia, e a mesma vegetação aparece (não necessariamente com rosetas), mas nós lembramos daquela primeira experiência e usamos o chinelo. Estamos em confluência saudável com aquela experiência, pois ela nos é acessível, estamos conscientes de onde vem nossa resposta. Agora, supondo que situações assim se repitam incessantemente, vire hábito e caia no esquecimento (se passamos a nunca mais andar descalços em momento algum, por exemplo), há a confluência disfuncional. Esse é um exemplo simplório, mas que serve para demonstrar a diferença entre a confluência saudável e a disfuncional, pois em GT, SEMPRE há o lado saudável, que deve ser tão valorizado quanto o disfuncional, visto que este já foi saudável um dia.
Na confluência disfuncional é como se a pessoa não conseguisse se separar e diferenciar do meio. Não há identificação das suas necessidades, pois o fundo não dá sustentação para a formação de figuras, visto que está inacessível.
Resumindo, quando temos um determinado hábito ou comportamento, o qual não conseguimos identificar de onde veio, os motivos que estão nos levando atualmente a agir assim, estamos em confluência disfuncional, já que não estamos fazendo contato com o momento/situação presente.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

A dor e o acolhimento

Todos nós nascemos com um sentido de equilíbrio social e psicológico e buscamos estar em acordo com as nossas necessidades pessoais e as demandas que advém da sociedade. A neurose se manifesta quando o indivíduo e o grupo (família, estado, círculo social, companheiros de trabalho) vivenciam necessidades diferentes e ele não consegue identificar qual é a dominante (a sua ou a do meio). Nesta situação de conflito, ele precisa tomar uma decisão clara do que precisa fazer (e assumir as conseqüências por sua escolha). Nesse sentido, a neurose vem da incapacidade do indivíduo encontrar e manter esse equilíbrio entre ele e o resto do mundo, entre os seus interesses e os dos outros. É como se os limites do meio o “atropelassem” e a forma que ele encontra de se defender desse mundo esmagador é a neurose. Por isso, para os gestalt terapeutas, mesmo as psicopatologias, guardam em si um lado saudável, pois demonstram a forma que o indivíduo encontrou de se defender e sobreviver às situações e vivências que julgou/julga ameaçadoras.
Para Spangenberg (1996), "a neurose é uma resposta estereotipada, como a da árvore que cresceu num lugar de muito vento; sua inclinação é um esforço feroz para sobreviver a essa situação, é sua melhor e única resposta. No entanto, continua inclinada mesmo nos dias calmos, pois ficou congelada em sua posição de sobrevivência, de resistência, de combate".
                                                        
Resistir, para a GT, significa defender o limite além do qual não se sabe o que fazer, nem o que ser. As pessoas resistem à medida em que "vivenciam" uma ameaça à sua identidade e é justamente por esse motivo, que entendemos que todo sintoma está a serviço de algo, que toda patologia é, de certa forma, a resposta mais saudável que aquela pessoa consegue dar no momento. E quando um sintoma causa dor, desconforto e impedimentos que levam alguém a buscar ajuda, é justamente quando o potencial para a mudança está mais "à flor da pele". Tudo nessa pessoa, está pedindo pra que a gestalt seja fechada e que uma nova configuração seja formada. Na própria biologia, a dor é encarada como algo saudável, pois é o que nos dá o aviso de que algo não está bem, algo está demandando cuidado, carinho, preservação.
Por isso, em terapia, é imprescindível o acolhimento do cliente em sua dor, seu sofrimento. Seus motivos de sofrimento são encarados por nós, terapeutas, como extremamente válidos, já que aquele sofrimento, pra ele, é terrivelmente real e é, ao mesmo tempo, o melhor que ele tem podido fazer até o momento. Foi a melhor resposta que ele soube/pôde dar pra conseguir seguir adiante e sobreviver. É justamente o fato de essa resposta não estar mais sendo suficiente, e de haver no cliente muito mais capacidade e potencial do que ele mesmo consegue se dar conta no momento, que faz doer. E é no sentido de ajudá-lo a acessar essas novas respostas e potenciais, que nós, gestalt-terapeutas, iremos atuar. Sempre oferecendo o suporte e acolhimento que essa pessoa não sente estar recebendo do meio.



Referência da citação: Spangenberg, A. – Terapia Gestáltica e a inversão da queda. São Paulo: Paulinas, 1996.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Ajustamento Criativo e Neurótico

Já mencionei anteriormente que o que realmente me encanta na GT é o fato de que esta abordagem não categoriza o indivíduo numa patologia qualquer, num rótulo que possivelmente o irá acompanhar vida afora e que irá afetar seu modo de se relacionar com o mundo e perceber a si mesmo.
Hoje vou tentar ir um pouco mais a fundo no modo com a Gestalt entende que as pessoas adoecem. Primeiramente, todas aquelas doenças das quais ouvimos falar diariamente - transtorno bipolar, depressão, transtorno obessessivo compulsivo, esquizofrenia, entre outros -, em gestalt vamos chamar de neurose, ou melhor ainda, de ajustamento neurótico. Ok...com isso em mente, vamos começar a diferenciar um funcionamento saudável de um funcionamento disfuncional.
Como falei anteriormente, estamos sempre buscando voltar ao nosso estado de equilíbrio a partir da satisfação das nossas necessidades (figuras) que emergem de um fundo. Dessa forma, quando um homem sente o excitamento que pede para ser saciado e busca soluções para poder satisfazer aquela necessidade, ou, ao contrário, se ele deixa de lado o que não é seu ou que não considera como sendo vitalmente interessante, pode-se dizer que ele tem um funcionamento sadio, já que está fazendo o melhor que pode de acordo com o que o meio lhe oferece, e a isso chamamos Ajustamento Criativo (“ajustamento” pois é feito, vivido e dinâmico, não-passivo e “criativo” no sentido de estar ligado à busca de um equilíbrio dinâmico, de uma auto-regulação). No entanto, se ele se aliena, se não se dá conta do que acontece consigo mesmo e não consegue formar figuras, identificar suas necessidades, sua espontaneidade está comprometida e isso torna sua vida confusa, dolorosa e nesse caso, diz-se que há um Ajustamento Neurótico. No Ajustamento Neurótico a necessidade genuína não pode ser satisfeita, pois não é identificada.
De acordo com visão gestáltica de homem e de como este relaciona-se no campo, toda e qualquer psicopatologia (forma disfuncional de agir no campo) é na verdade, um ajustamento neurótico, que em algum momento, foi criativo (tenham isso em mente!). Ou seja, se em alguma situação de sua vida o excitamento surgiu, pedindo para ser satisfeito, mas houve uma repressão desse excitamento, seja porque as possibilidades de satisfação não foram fornecidas pelo meio, ou porque eram demasiado ameaçadoras e houve a deliberação consciente em não satisfazê-las; houve um ajustamento criativo, pois a pessoa fez contato com sua necessidade e com o meio. Mas se situações assim tornaram-se crônicas, a resposta de conter o excitamento torna-se um hábito. Aquilo que antes era criativo, pois estava em contato com o momento presente, deixa de sê-lo. Por isso é que se diz que no ajustamento neurótico, a pessoa dá respostas antigas, a situações novas. Não há contato com o momento presente e a pessoa não consegue assimilar que aquelas respostas que serviram lá atrás, não se encaixam mais com a situação atual.
A neurose, para a Gestalt-terapia, nada mais é do que a incapacidade de alterar as técnicas de manipulação e interação com/no meio. Quando se dá respostas antigas a situações novas, fica-se menos disponível a ir ao encontro de qualquer de suas necessidades de sobrevivência, inclusive as sociais. A deliberação saudável ocorre quando há a restrição consciente de determinados interesses, percepções e movimentos para concentrar a atenção em outra parte. No entanto, o comportamento neurótico é aprendido quando essa deliberação por “não agir”, ou segurar um impulso, torna-se um hábito pela repetição e dali a algum tempo, não se entrará mais em contato com aquele hábito (a pessoa não se dá mais conta daquilo). Se alguém tem o hábito de andar corcunda, por exemplo, deixar de fazê-lo torna-se doloroso pois é como se o "ser corcunda" fosse sua forma natural de funcionar.

Ainda há outros aspectos a serem considerados relativos ao ajustamento neurótico, mas irei falar sobre eles nos próximos posts, já que é muita informação pra ser digerida e assimilada.
Até a próxima!

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Recupere seus sentidos

Hoje eu vou dar uma pausa nos conceitos propriamente ditos da GT, e vou falar sobre algo que também dá base pra muitas das coisas que a gente vê em terapia e que os pacientes trazem com muita frequência, das mais variadas formas.Todos nós temos a total capacidade de escolher e discriminar as coisas que nos fazem bem, que nos são necessárias. Todos nós nascemos com o potencial e capacidade de usar nossa sensorialidade pra nos orientar no meio, no mundo. É essa sensorialidade que muitas vezes nos aparece como um "feeling", uma intuição em relação a determinadas pessoas ou acontecimentos - "fulano está me enrolando", "acho que eu não devo falar sobre certo assunto pra tal pessoa", e por aí vai.
O problema é que da mesma forma que todos nós nascemos com essa perfeita habilidade, todos nós fomos (e continuamos sendo ao longo da vida) desconfirmados naquilo que sentimos. Quem nunca ouviu ao menos uma vez, quando criança, um "não foi nada" depois de cair e se machucar e estar sentindo dor? Claro que foi alguma coisa! Tudo em nosso corpo diz que foi alguma coisa  e que está doendo! Não é por maldade que ouvimos isso de nossos pais, avós e cuidadores em geral. Eles também já ouviram isso. Mas em geral, as pessoas se sentem aflitas com a dor alheia, é desconfortável lidar com ela, acredito  que talvez seja porque de certa forma, a dor alheia as faça lembrar das suas próprias dores. E aí na tentativa de ajudar, vamos desde cedo, ensinando a criança que ela não pode confiar naquilo que sente. Que o tombo que ela levou e que doeu, não foi nada; que ela precisa comer quando lhe dizem, ainda que não esteja sentindo fome ou vontade de comer.Situações assim vão se repetindo durante toda a nossa vida.
Somos constantemente interrompidos, atropelados em nossos limites, desconfirmados nas nossas sensações e sentimentos (pois acreditamos, quando crianças, que nossos pais sabem mais do que nós. São eles os nossos modelos de aprendizagem) e nos tornamos pessoas inseguras. Essa habilidade de saber (no sentido mais amplo da palavra) das nossas coisas ainda está ali; a "intuição" ainda vem, mas nós mal nos apercebemos dela, nos tornamos "dormentes". Perls tem uma frase que é "esqueça sua razão e recupere os seus sentidos"  que quer dizer justamente que precisamos recuperar a crença nossa capacidade inata de cuidar de nós mesmos, de reconhecer nossas próprias necessidades e sentimentos e ir ao meio em busca de formas de satisfazê-las. É recuperar a confiança de que nós possuímos a nosso alcance tudo aquilo de que necessitamos, justamente porque nosso corpo, nossa percepção nos mostra isso com uma maravilhosa exatidão.

E por hoje é isso! Espero que esse post ajude alguém (ou alguéns) a recuperar seus sentidos!

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Contato

Estamos o tempo todo nos relacionando com o meio, agindo nele e sendo influenciados por ele. Em gestalt-terapia, chamamos essa interação organismo/ambiente de campo. Se o relacionamento do homem nesse campo é mutuamente satisfatório, é considerado saudável; se não, considera-se disfuncional.
Para conectar-se com o meio em que vive, o homem faz uso de seus sentidos, que lhe dão uma orientação e lhe apontam que necessidades devem ser supridas. Seu sistema motor dá a direção, vai ao encontro dos suplementos necessários para satisfazer essas necessidades. Quando esses objetos ou pessoas são percebidos como “bons” ou necessários, o organismo estende-se em direção ao meio. No entanto, quando pessoas ou objetos são percebidos como ameaçadores ou que indiquem perigo, a orientação com relação ao meio muda e pode haver a fuga ou retraimento do excitamento ao buscar aquilo que se necessita. Nesse sentido, fugir não significa necessariamente um comportamento defensivo disfuncional.
A esse engajamento do indivíduo de buscar aquilo que é mais relevante e emergente para si a cada momento no campo, chamamos contato. Para que haja o contato, é preciso que figura esteja clara. Quando não conseguimos identificar aquilo que necessitamos, o que nos tirou do nosso estado de equilíbrio (olha a homeostase aí de novo), não há contato e portanto, não conseguimos ir ao meio para fechar a gestalt e voltar ao estado de equilíbrio.
Por exemplo, quando o níveis de glicose em nosso sangue caem, sentimos uma variedade de "sintomas", inclusive a fome. Quando eu identifico que estou com fome e ajo no meio em busca formas de saciá-la, está estabelecido o contato. Caso eu identifique algo ameaçador em simplesmente saciar a fome (se sou intolerante a lactose, por exemplo, e só há derivados do leite em casa), nesse caso haverá a fuga, mas ainda assim, será contato e será funcional. Posso a partir daí identificar novas possibilidades para fechar a gestalt (ir ao supermercado, por exemplo).

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Figura e Fundo

Todos nós temos a nossa "bagagem", de tudo aquilo que vivemos e experienciamos, nossas lembranças, nossos conceitos, nosso modo de encarar e perceber a vida e as coisas à nossa volta. A isso, chamamos de Fundo.
Em contrapartida, tudo aquilo que nos chama a atenção em determinado momento, que nos prende, seja um objeto, seja uma necessidade que precisa ser satisfeita (fome, sede, amor, dinheiro, etc.), é o que chamamos de Figura em Gestalt-terapia.
Estamos constantemente alternando figura e fundo. Nesse momento, por exemplo, a figura pra mim é escrever esse post ilustrando esse conceito da Gestalt, de forma que fique claro para os leitores. O fundo é tudo aquilo que eu tenho a fazer depois; É aqui que está minha energia e meu engajamento, então essa é minha figura.
O que você vê na ilustração abaixo?

Um homem tocando saxofone ou a sombra do rosto de uma mulher?
Você pode ver ambos, mas acada momento, uma das duas imagens "salta" mais aos seus olhos. Essa alternância de uma para a outra às vezes é tão rápida que até parece que conseguimos ver ambas ao mesmo tempo, mas não. Esse processo rápido de alternância entre figura e fundo acontece também em nossas vidas. A cada momento, e de acordo com nossas necessidades e interesses, nossa figura muda. Se enquanto estou escrevendo, sinto sede, a sede passa a ser minha figura e escrever aqui torna-se fundo até que minha sede seja satisfeita. Por isso diz-se que este processo de alternância é fluído.
Quando não há fluidez nesse processo, e a pessoa não consegue formar figuras claras e nítidas, ou seja, quando não consegue identificar suas necessidades, aquilo que precisa para se sentir satisfeita; diz-se que a gestalt (a configuração) não foi fechada, está fixa ou cristalizada.
Outro ponto importante: a mesma figura pode ter significados diferentes de acordo com o fundo do qual emergem. Se eu vejo um copo recipiente com água e algo começa a pegar fogo, nesse momento a água significa apagar o fogo. Se estou com sede e vejo a água, ela tem o significado de saciar minha sede.
Qualquer correlação que se possa fazer entre esse processo e o conceito de homeostase abordado no post anterior não é mera coincidência. Enquanto nossas nossas gestalts em aberto não tiverem um fechamento, nosso equilíbrío fica capenga e por conseguinte, nossa saúde também...

Por hoje é isso! Á medida que outros conceitos forem aparecendo, cada vez mais eles começarão a se interelacionar e a fazer sentido. Como a própria Gestalt afirma, "o todo é diferente da soma das partes". Todos os conceitos e idéias aqui expostos se relacionam entre si.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Homeostase - saúde e "doença"

Dando continuidade ao esclarecimento sobre o olhar da GT sobre o homem e o mundo, hoje vou abordar um dos conceitos centrais, que mais tarde vão embasar várias indagações, questionamentos e colocações acerca das dificuldades que nós encontramos durante a nossa caminhada pela vida.
Estou falando da homeostase, que nada mais é que o processo através do qual o organismo satisfaz as suas necessidades e interage com o seu meio, buscando o equilíbrio. Para a GT, a homeostase não se refere apenas aos aspectos fisiológicos de fome, frio, calor, mas também aos aspectos psicológicos.
Você pode se perguntar de que forma esse conceito vai influenciar num processo terapêutico? E a resposta que eu dou para essa pergunta é que esse "pequeno" conceito tem implicações como o fato de que a partir do momento que entendemos que o organismo como um todo - no post anterior falei sobre o conceito de que o todo é diferente da soma das partes e funcionamos como um TODO -, que busca constantemente no meio em que está inserido, estar em equilíbrio, muda também o conceito de "saúde e doença" com o qual estamos acostumados a trabalhar.
Uma das coisas que mais me encanta na Gestalt-terapia é justamente isso! Uma pessoa que se encontra com dificuldades na vida, que se encontra em momento de dor, sentindo-se deprimida, com fobias que não consegue explicar ou resolver, na verdade está numa busca desesperada por reestabelecer seu equilíbrio.
Alguma coisa ou acontecimento, em algum momento, interrompeu a sua possibilidade de auto-regulação com o meio, de satisfazer suas necessidades.
Para a GT saúde não significa a ausência de doença. Considera-se que quando o processo homeostático (no sentido fisiológico e psicológico) é mantido, tem-se o estado de saúde, ainda que em condições adversas. Quando a pessoa consegue identificar suas necessidades, quando consegue formar uma figura clara, nítida e discriminar como pode satisfazer aquela necessidade, fechar a gestalt, se o seu relacionamento no campo organismo/ambiente é mutuamente satisfatório, é considerado saudável, caso contrário, considera-se disfuncional (e não "doente").
Ou seja, nossa maneira de lidar com as variadas neuroses, como chamamos em psicologia, é justamente não enquadrando o indivíduo dentro de uma patologia (fulano é depressivo, ciclano é bipolar e etc.), pois entendemos que esta é apenas uma maneira que ele encontrou de lidar com a situação em determinado momento, de acordo com as condições e o suporte que tinha naquele momento.

Essa discussão ainda rende muito pano pra manga e há ainda muitas outras coisas envolvidas nessa simples colocação. Proponho que cada um possa questionar seu modo de funcionar perante as mais diversas situações e as coisas que gostariam de mudar, e se perguntem se em algum momento, esse modo de agir não foi o melhor que tinham à sua disposição na época de sua origem e se hoje, ele ainda é o melhor que se tem às disposição.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Conheçendo a Gestalt-terapia

Para aqueles que não conhecem, nunca ouviram falar dessa linha da psicologia, ou mesmo para os que vivenciam um processo terapêutico fundamentado nessa abordagem e gostariam de conhecer mais, começa hoje uma série de postagens com conceitos básicos e fundamentais que dão o embasamento para todo o trabalho terapêutico. Iniciando então com o próprio termo - "Que raio é esse de Gestalt??"

A palavra Gestalt tem origem alemã e surgiu de uma tradução da Bíblia, significando “o que é colocado diante dos olhos, exposto aos olhares”. Hoje adotada no mundo inteiro, significa um processo de dar forma ou configuração.
A Gestalt-terapia foi criada pelo médico alemão Frederick Perls, também chamado de Fritz Perls, que trouxe para sua nova abordagem  conceitos  e conhecimentos de outras abordagens filosóficas ou psicoterápicas, como a psicologia existencial, a psicologia fenomenológica, psicologia humanista, psicanálise (Freudiana e de alguns dos discípulos de Freud), os trabalhos de Kurt Lewin, Reich, a psicologia da gestalt, a teoria organísmica de Goldstein. É dessa base de influências que se pode depreender a visão de ser humano da abordagem gestáltica.

Vamos lá então! Filosoficamente falando, a Gestalt-terapia se apóia no Existencialismo e na Fenomenologia.
De acordo com a fenomenologia, a consciência só pode ser concebida a partir do fato de que só pode ser consciência de algo (algum objeto) e o objeto só é objeto para uma consciência, ao contrário do conceito de consciência da psicanálise, que acredita se esta uma estrutura psíquica. Para a GT, só é possível ter consciência de alguma coisa e as inter-relações entre consciência e objeto constituem o fenômeno. A fenomenologia busca a descrição do fenômeno enquanto e como é revelado à consciência da maneira mais fidedigna possível.

O existencialismo, por sua vez, prega que o homem é livre, e é a partir dessa liberdade que ele se torna responsável pela sua existência. Portanto, o homem se constitui a partir do que vive, e atua na relação que estabelece com o mundo de forma a exercer seu arbítrio. É de Sartre, o "pai" do existencialismo, a frase: "o importante não é o que fazem de nós, mas o que nós fazemos do que fizeram de nós". Ou seja, a cada ato devemos conscientizar-nos de nossa escolha, entendendo que as possibilidades de lidar com determinado fato são escolhidas a cada instante por quem os vive.

Há, ainda, as teorias de base da gestalt-terapia que são o humanismo, psicologia da Gestalt, teoria de Campo, teoria Organísmica e teoria Holística.
- Humanismo: define o homem como o ser que é o criador do seu próprio ser, pois o humano, através de sua história, gera a sua própria natureza.
- Psicologia da Gestalt: voltada basicamente aos fenômenos perceptivos e sua organização: nossa percepção se organiza por intermédio da formação de totalidades (Gestalten), que são percebidas de modo natural e espontâneo pelo ser humano. Essas totalidades são constituídas por figura e fundo e  “o todo é diferente da soma das partes”. 
 -Teoria de Campo: o meio onde o indivíduo está inserido é fundamental para a sua compreensão; não é possível saber de que pessoa falamos sem olhar para o todo que compõe sua existência, do qual faz parte também o mundo que a cerca. Conhecer alguns aspectos de uma pessoa não equivale a conhecer toda a pessoa; uma parte nos dá certas notícias do todo, mas não é o todo.
- Teoria Organísmica: um sintoma não pode ser compreendido em sua totalidade se o indivíduo não for também visto em sua totalidade. O que ocorre numa parte, afeta o todo. Segundo esta teoria, o homem é dominado por um impulso dominante de auto-regulação.
- Teoria Holística: Holos do grego = completo. O Universo e especialmente a natureza viva, se constitui de unidades que formam todos (como organismos vivos) que são mais do que a simples soma de suas partículas elementares. Não é possível separar nenhuma dessas partes para observá-la sem que se perca o sentido global do que está acontecendo. Qualquer manifestação psíquica tem seu correlato físico aparente.
Bom, por hoje acho que já tem bastante conceito pra ser digerido...muitas coisas que aparecem nesse post vão aparecer mais à frente mais "esmiuçadas". A intenção agora era realmente dar um apanhado geral do que é essa abordagem terapêutica.
Até a próxima